Reproduzido de www.oeco.org.br
Já se passaram três anos desde a entrada em vigor do atual Código Florestal brasileiro, mas um dos dispositivos considerados indispensáveis para sua concreta aplicação, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), insiste em não se tornar realidade. Na véspera da data estipulada pelo governo como limite para a conclusão do CAR, procedimento que deve ser obrigatoriamente cumprido por proprietários rurais de todo o Brasil, os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário) se reuniram para anunciar a prorrogação do prazo de cadastramento por mais um ano, até o dia 5 de maio de 2016.
A decisão pelo adiamento do prazo atende a inúmeros apelos de setores diversos, passando por 48 secretarias estaduais ou municipais de Meio Ambiente e Agricultura, pela Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária (CNA), entidade representativa dos grandes produtores e do agronegócio, e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), que representa a agricultura familiar. Mas reflete, sobretudo, o próprio fracasso do cadastramento, já que, segundo os dados apresentados pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), apenas 25% de um universo de 5,6 milhões de propriedades rurais cumpriu o CAR até o início de maio. Após um ano de cadastramento aberto, somente 52,8% dos quase 372 milhões de hectares passíveis de regulamentação no país foram cadastrados.
Uma vez definida a prorrogação por mais um ano do prazo para a realização do CAR, a preocupação maior do governo passa a ser acelerar o cadastramento, sobretudo, entre os pequenos produtores, donos de propriedades com até quatro módulos fiscais (cuja medida varia de região para região do país). Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), cerca de 90% das propriedades rurais no Brasil têm essa medida máxima, mas estas representam pouco mais de 10% dos 25% de cadastros efetuados até o momento: “Vamos avançar mais rapidamente daqui pra gente”, disse o ministro Patrus Ananias.
Em fevereiro, a ministra Izabella Teixeira se reuniu com representantes da direção da Contag, em discussão que teve a necessidade de cumprimento do CAR como principal ponto de pauta: “Nos comprometemos com o MMA a fazer o CAR acontecer. Agora, mesmo com mais tempo, a ideia é inserir de vez o CAR na pauta da agricultura familiar”, diz o presidente da entidade, Alberto Broch.
A disposição do governo em avançar com o CAR em meio aos agricultores familiares se revelou também na nomeação, confirmada na semana passada, do ex-presidente do Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra), Carlos Guedes, para a Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do MMA. A presença de Guedes, que tem experiência sobre os meandros burocráticos da relação com os pequenos produtores rurais e, ainda por cima, bom trânsito político com organizações como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), promete dar celeridade ao processo de cadastramento.
O ministro do Desenvolvimento Agrário afirmou ainda que os assentamentos da reforma agrária também fazem parte da base de dados do CAR. De um total de 6.996 assentamentos com unidades agrícolas em todo o país, já estão cadastrados 4.425, no equivalente a uma área de 28,1 milhões de hectares: “O cadastramento é uma forma de promover a agricultura familiar e irá beneficiar 722 mil famílias assentadas”, disse Patrus.
Parcerias
Para acelerar o CAR e auxiliar os pequenos produtores no preenchimento do cadastro, o governo contará com parcerias firmadas com órgãos do governo, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), além de entidades da sociedade civil. Em abril, na sede da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, no Rio de Janeiro, nove entidades firmaram com o MMA um Termo de Cooperação Técnica para o planejamento da recuperação, controle e investimento socioambiental nas pequenas propriedades cadastradas.
No que diz respeito a parecerias, Izabella Teixeira fez uma crítica aos governadores dos estados brasileiros: “A baixa adesão ao CAR mostra que possivelmente alguns estados não estão trabalhando na gestão, do ponto de vista de incluir e viabilizar o cadastro, porque R$ 400 milhões é muito dinheiro e tem estado que não tem essa execução orçamentária. Os governadores têm que vir dar conta do CAR. Aquilo que era responsabilidade do governo federal, nós fizemos”, disse a ministra, fazendo referência ao montante disponibilizado pelo Fundo Amazônia para a realização do cadastramento.
Regiões
Os números mostram que neste último ano a realização do CAR aconteceu de forma muito desigual entre as regiões do país. De acordo com o balanço divulgado pelo MMA, o cadastramento avançou muito mais nos estados que fazem parte da Amazônia Legal. Já nas regiões com mais terras agrícolas, sobretudo da agricultura familiar, o resultado foi muito aquém do esperado pelo governo.
Na Região Norte, os melhores desempenhos foram obtidos no Amazonas (com 93,77%da área cadastrável do estado registrada), Acre (93,67%), Amapá (79,64%) e Pará (76,51%). Em seguida, aparecem Rondônia (69,24%), Roraima (53,69%)e Tocantins (22,97%). Na média, a Região Norte teve 69,26% de suas terras já cadastradas.
Também parte da Amazônia Legal, o estado do Mato Grosso, considerado um dos berços do agronegócio brasileiro, é o vice-campeão do CAR, com 99,3% de suas terras registradas, atrás somente de Brasília, única unidade da federação com a ter completado o cadastramento. Já Goiás teve apenas 28,14%. A média da Região Centro-Oeste foi de 54,23%.
Símbolo de que o CAR caminhou mais lentamente nos estados com maior produção em um maior número de propriedades rurais, o Rio Grande do Sul, com apenas 0,84% de suas terras cadastradas, teve o pior desempenho nacional. Paraná (22,33%) e Santa Catarina (34,91%) tiveram desempenho melhor, e a média da Região Sul ficou em 13,7%.
No Sudeste, que teve média de 27,36%, o estado com mais terras registradas foi o Rio de Janeiro (43,05%), seguido por São Paulo (31,97%), Minas Gerais (25,09%) e Espírito Santo (15%). Já na Região Nordeste, a média de terras registradas no fim de março foi de 15,38%, com destaque para o Maranhão, que também faz parte da Amazônia Legal, com 52,33%.