De forma silenciosa e quase imperceptível o fenômeno da desertificação, que é a seca no seu pior estágio devido ao alto teor de desidratação do solo, vem avançando em Alagoas e comprometendo o Produto Interno Bruto (PIB) do estado. O problema é agravado pelos longos períodos de estiagem, cada vez mais frequentes nas últimas décadas.
Um estudo elaborado por pesquisadores do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), expõe que 10,5% do semiárido do estado, que compreende 14 municípios, apresenta sinais de desertificação, com degradação ambiental grave ou muito grave que pode até mesmo deixar o solo infértil.
“A desertificação é uma tragédia silenciosa porque, com impactos ambientais muitas vezes imperceptíveis, quando uma área se torna improdutiva, os problemas socioambientais interferem na qualidade de vida da população. Que se torna refém das condições climáticas”, avalia o meteorologista e pesquisador do Lapis, Anselmo Santos.
Consequências – O agricultor Denilson Matias da Silva conta que, assim como ele, diversas pessoas que sobreviviam da agricultura foram obrigadas a substituir a lavoura de milho e feijão pela criação de animais devido ao fenômeno da desertificação.
“Essa seca extrema já é visível em muitos lugares daqui de Palestina. Há anos agricultores deixaram de plantar algumas lavouras porque a plantação não ‘vinga’ mais. Roça de milho e feijão estão sendo substituídas por criação de animais. Algodão, que era algo comum aqui, eu já não planto há mais de três anos”, relata Silva.
“Aqui não há grandes propriedades. Mas sim, pequenos produtores, que comem do que plantam. Com essa desertificação, o município fica mais pobre. Quem plantava o feijão para comer e vender, agora tem que pagar por ele”, lamenta o agricultor.
A pesquisa do Lapis, em parceria com o Instituto Nacional do Semiárido (INSA), avaliou o impacto na vegetação da região através de imagens de satélites com base em dados do ano 2014.
O estudo aponta que os municípios alagoanos mais afetados pela desertificação são Olivença, Carneiros, Monteirópolis, Olho D’Água das Flores, Major Isidoro, Batalha, Palestina, Jacaré dos Homens, Pão de Açúcar, São José da Tapera, Cacimbinhas, Girau do Ponciano, Traipu e Dois Riachos.
Danos e reversão – Ao apontar variações climáticas e a intervenção humana como potencializadores da desertificação, o pesquisador Anselmo Santos estima que 26% da população que vive no semiárido alagoano já sofra com as causas do fenômeno e expõe que os danos identificados precisam ser rapidamente revertidos.
“A gravidade da desertificação depende de como o fenômeno é tratado. Se houver descaso, ele poderá aumentar a abrangência de forma gradativa, gerando mais impacto para o meio ambiente e a população. É possível controlar, evitar e até mesmo reverter o fenômeno, no entanto, essa é uma tecnologia cara que depende do envolvimento de governos e auxílios técnicos que ajudem no manejo de preservação das áreas já desgastadas”, diz Anselmo Santos.
Quanto ao custo social, ambiental e econômico da desertificação, o pesquisador relata que o fenômeno implica diretamente no PIB dos municípios afetados, mas que o prejuízo nem sempre tem como ser contabilizado.
“Sabemos que a desertificação compromete o PIB do estado. No entanto, não temos como projetar diretamente essas perdas. Se a agricultura e a pecuária são as principais atividades econômicas do semiárido alagoano, e o sertanejo fica impossibilitado de plantar com a improdutividade do solo, consequentemente isso causar danos socioeconômicos”, completa.
Combate à seca extrema – O superintendente de Meio Ambiente da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh), Mateus Gonzales, diz que a secretaria possui um Plano de Ação Estadual para Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos de Seca.
Gonzales explica que a desertificação é um problema que não pode ser resolvido de forma pontual. “Estamos atuando em recuperação de áreas e com educação ambiental, para que os agricultores adotem formas mais ecológicas no manejo do solo”.
Segundo ele, o uso inadequado do solo é um dos maiores potencializadores da desertificação. “O grande problema destas áreas é que elas foram esgotadas pela forma de manejo da agricultura. Algo que é uma questão cultural e que não é fácil mudar. Por anos essas áreas sofreram com queimadas, com a monocultura e outros problemas que ajudaram no empobrecimento do solo”, expõe Mateus Gonzales.
Assim, ele diz que a Semarh vem adotando diversas ações no combate ao empobrecimento do solo. Como a construção de barreiras, recuperação de áreas com reflorestamento e outras técnicas, além da expansão da distribuição de água através do Canal do Sertão.
Esta última vem sendo contestada por algumas organizações, já que o acesso à água do canal não vem ocorrendo de forma adequada para os sertanejos, que são obrigados a recorrer ao improviso para conseguir suprir as necessidades do líquido.
“Como Alagoas possui 65 municípios que ficam em áreas de semiárido, é preciso garantir água para o abastecimento humano e animal, e a agricultura. Para isso, contamos com novas adutoras para tratamento e distribuição de água, o projeto Água Doce, com dessalinizadores, além de ações para recuperação de nascentes. Combater a desertificação não é simples, nem barato, mas acreditamos que é possível”, relata Mateus Gonzales.
Ações paralelas – Quem também vem investindo em ações contra a desertificação é a Organização de Preservação Ambiental (OPA), que em parceria com diversas instituições vem recuperando nascentes no semiárido alagoano.
Na primeira etapa do projeto, a organização recuperou 55 nascentes no Sertão alagoano, melhorando o acesso e a qualidade da água usada por centenas de famílias que vivem nos municípios de Águas Branca, Pariconha e Mata Grande. (Fonte: G1)