Este termo “biochar” resulta de “biomass + charcoal” (biomassa + carvão, em inglês). Surgiu da observação da existência da nossa “terra preta dos índios”, solo da Amazônia central. Trata-se de trecho de latossolo caolinítico amarelo (originariamente pobre em nutrientes) onde se supõe que ao longo do tempo os índios foram acumulando matéria orgânica, tornando-o muito fértil. É considerado um epipedon antropogênico, ou seja, um horizonte superficial originado de atividades humanas. O processo de produção do “biochar” consta basicamente, de pirólise de biomassa (400 a 500oC) em atmosfera quase sem oxigênio, formando-se assim carvão, com emanação de alguns gases do efeito estufa. A foto ao lado (da revista “Nature”) mostra um forno de microondas para produzir “biochar” em escala industrial, na Nova Zelândia.
Defensores desse “carvão com nome sofisticado”, como o pesquisador Johannes Lehmann, professor da Universidade de Cornell, E.U.A., visualizam grandes benefícios para o nosso planeta no aspecto relacionado ao seqüestro de carbono. Calcula-se que anualmente são emitidos para a atmosfera de 8 a 10 bilhões de toneladas de carbono. Admitindo-se que mais ou menos metade seja adsorvida pelos oceanos e ecossistemas terrestres, cerca de 4 bilhões permanecem na atmosfera. As plantas verdes, no entanto, são capazes de absorverem mais de 60 bilhões de toneladas pela fotossíntese. Mas como as próprias plantas emitem gás carbônico em grandes quantidades para a atmosfera, pela respiração, o armazenamento de carbono no solo poderia ser um meio eficiente de tirá-lo de circulação. Calcula-se ainda que uns 10% dessas 60 bilhões de toneladas de carbono terminem no ambiente como resíduos (de cultivos, das florestas, dos animais...); ou seja, 6 bilhões de toneladas, metade das quais, ou 3 bilhões de toneladas de carbono, poderiam ser submetidas a pirólise e transformadas em “biochar”.
Defensores desse produto ainda consideram que a própria biomassa geraria a energia suficiente para a pirólise e que um terço da biomassa seria biocombustível. Florestas seriam introduzidas nos 900 milhões de hectares de terra degradada, no mundo. Idéia esta melhor do que a de outros pesquisadores, que sugerem que florestas sejam derrubadas para produzir “biochar” e depois replantadas... e assim por diante! Johannes Lehmann, seu principal defensor, sugere que muitos solos melhorariam sua produtividade. Haveria adição de alguns nutrientes, como fósforo, potássio, zinco, cálcio. Isto certamente não seria aconselhado a ser feito nos latossolos da Amazônia, pois o cultivo itinerante ali praticado pelos indígenas (e até hoje imitado por muitos dos exploradores da Amazônia) mostrou ser improdutivo (o solo se beneficia em curto espaço de tempo com o acréscimo desses nutrientes, que são absorvidos pelos plantios e levados do local em forma de produtos alimentícios ou fibras, e o restante é facilmente lixiviado pela alta precipitação pluvial local).
Os críticos do “biochar” advertem que enterrá-lo no solo poderá significar que ali ele ficará por milhares de anos. Talvez não fique, se não for enterrado muito profundo. Pesquisa de um cientista sueco (Wardle, D. A. Science 320, 629 (2008)) mostrou que pelo menos em floresta boreal na Suécia o carvão, quando misturado ao húmus, se decompõe mais rápido do que se supunha. Mas há quem aponte problemas ambientais outros, como Almuth Ernsting, um pesquisador de organização britânica ambiental (“Biofuelwatch”): o seqüestro de (modestos) 1 bilhão de toneladas de carbono, por esse processo, requereria 500 milhões de hectares de terra, enquanto as florestas remanescentes tropicais representam hoje cerca de 1,5 bilhão de hectares.
Em se tratando do “biochar” e o aquecimento global, em solos tropicais, eu vou um pouquinho mais adiante! Em experimentos que realizei na Estação Experimental de Rothamsted (Inglaterra), comparando reações dos microrganismos ao aumento de temperatura [trabalhos publicados em Soil Biology and Biochemistry (1997) 30 (10/11): 1309-1315; e na Revista de Microbiologia (1997) 28(1): 5-10)] observei que: o total de carbono respirado pela microbiota dos solos tropicais mantidos a 35oC ao longo de 150 dias de incubação, foi na faixa de 2,6 a 4,5 vezes o C presente inicialmente na biomassa microbiana; e a faixa correspondente dos solos temperados foi de 3,2 a 9,7 vezes. Algumas conclusões: (a) a microbiota de ambos os conjuntos de solos consumiram não somente o carbono da matéria orgânica neles existentes, mas também alimentaram-se dos microrganismos mortos, emanando carbono pela respiração; (b) em ambos os solos os microrganismos mostraram que com o aquecimento global, eles contribuirão com mais carbono para a atmosfera (os solos temperados mais do que os tropicais).
Em termos do que vai acontecer com um “biochar” nos nossos solos tropicais, ainda ficam algumas perguntas que precisam ser respondidas, como por exemplo: (i) como se comportarão os microrganismos com o aumento da relação carbono:nitrogênio (se for muito alta, a microbiota poderá consumir o pouco nitrogênio disponível, não liberando-o para as plantas); (ii) que tipo de conseqüências poderá o “biochar” no solo causar aos demais escassos nutrientes, abaixo dos 15 cm superiores mais férteis dos nossos latossolos da floresta amazônica e da mata atlântica, por exemplo; (iii) em termos físico-químicos, quais serão as conseqüências... e outros questionamentos que certamente pedólogos, edafólogos, agrônomos e agricultores experientes saberão melhor formular do que eu.
Talvez possa se pensar que solos desprovidos de necromassa de superfície (solos provenientes de mineração, por exemplo) possam se beneficiar com a adição do “biochar”. Mas, em todos os casos, é melhor investigar com mais precisão sobre TODO esse procedimento, antes que queiram generalizá-lo e... (o que é muito pior!) antes de acharmos que esse produto é “um santo remédio” da geoengenharia e assim não precisaremos reduzir a emissão de gases do aquecimento global... e nem precisaremos nos preocuparmos em preservar nossas florestas!!!
Defensores desse “carvão com nome sofisticado”, como o pesquisador Johannes Lehmann, professor da Universidade de Cornell, E.U.A., visualizam grandes benefícios para o nosso planeta no aspecto relacionado ao seqüestro de carbono. Calcula-se que anualmente são emitidos para a atmosfera de 8 a 10 bilhões de toneladas de carbono. Admitindo-se que mais ou menos metade seja adsorvida pelos oceanos e ecossistemas terrestres, cerca de 4 bilhões permanecem na atmosfera. As plantas verdes, no entanto, são capazes de absorverem mais de 60 bilhões de toneladas pela fotossíntese. Mas como as próprias plantas emitem gás carbônico em grandes quantidades para a atmosfera, pela respiração, o armazenamento de carbono no solo poderia ser um meio eficiente de tirá-lo de circulação. Calcula-se ainda que uns 10% dessas 60 bilhões de toneladas de carbono terminem no ambiente como resíduos (de cultivos, das florestas, dos animais...); ou seja, 6 bilhões de toneladas, metade das quais, ou 3 bilhões de toneladas de carbono, poderiam ser submetidas a pirólise e transformadas em “biochar”.
Defensores desse produto ainda consideram que a própria biomassa geraria a energia suficiente para a pirólise e que um terço da biomassa seria biocombustível. Florestas seriam introduzidas nos 900 milhões de hectares de terra degradada, no mundo. Idéia esta melhor do que a de outros pesquisadores, que sugerem que florestas sejam derrubadas para produzir “biochar” e depois replantadas... e assim por diante! Johannes Lehmann, seu principal defensor, sugere que muitos solos melhorariam sua produtividade. Haveria adição de alguns nutrientes, como fósforo, potássio, zinco, cálcio. Isto certamente não seria aconselhado a ser feito nos latossolos da Amazônia, pois o cultivo itinerante ali praticado pelos indígenas (e até hoje imitado por muitos dos exploradores da Amazônia) mostrou ser improdutivo (o solo se beneficia em curto espaço de tempo com o acréscimo desses nutrientes, que são absorvidos pelos plantios e levados do local em forma de produtos alimentícios ou fibras, e o restante é facilmente lixiviado pela alta precipitação pluvial local).
Os críticos do “biochar” advertem que enterrá-lo no solo poderá significar que ali ele ficará por milhares de anos. Talvez não fique, se não for enterrado muito profundo. Pesquisa de um cientista sueco (Wardle, D. A. Science 320, 629 (2008)) mostrou que pelo menos em floresta boreal na Suécia o carvão, quando misturado ao húmus, se decompõe mais rápido do que se supunha. Mas há quem aponte problemas ambientais outros, como Almuth Ernsting, um pesquisador de organização britânica ambiental (“Biofuelwatch”): o seqüestro de (modestos) 1 bilhão de toneladas de carbono, por esse processo, requereria 500 milhões de hectares de terra, enquanto as florestas remanescentes tropicais representam hoje cerca de 1,5 bilhão de hectares.
Em se tratando do “biochar” e o aquecimento global, em solos tropicais, eu vou um pouquinho mais adiante! Em experimentos que realizei na Estação Experimental de Rothamsted (Inglaterra), comparando reações dos microrganismos ao aumento de temperatura [trabalhos publicados em Soil Biology and Biochemistry (1997) 30 (10/11): 1309-1315; e na Revista de Microbiologia (1997) 28(1): 5-10)] observei que: o total de carbono respirado pela microbiota dos solos tropicais mantidos a 35oC ao longo de 150 dias de incubação, foi na faixa de 2,6 a 4,5 vezes o C presente inicialmente na biomassa microbiana; e a faixa correspondente dos solos temperados foi de 3,2 a 9,7 vezes. Algumas conclusões: (a) a microbiota de ambos os conjuntos de solos consumiram não somente o carbono da matéria orgânica neles existentes, mas também alimentaram-se dos microrganismos mortos, emanando carbono pela respiração; (b) em ambos os solos os microrganismos mostraram que com o aquecimento global, eles contribuirão com mais carbono para a atmosfera (os solos temperados mais do que os tropicais).
Em termos do que vai acontecer com um “biochar” nos nossos solos tropicais, ainda ficam algumas perguntas que precisam ser respondidas, como por exemplo: (i) como se comportarão os microrganismos com o aumento da relação carbono:nitrogênio (se for muito alta, a microbiota poderá consumir o pouco nitrogênio disponível, não liberando-o para as plantas); (ii) que tipo de conseqüências poderá o “biochar” no solo causar aos demais escassos nutrientes, abaixo dos 15 cm superiores mais férteis dos nossos latossolos da floresta amazônica e da mata atlântica, por exemplo; (iii) em termos físico-químicos, quais serão as conseqüências... e outros questionamentos que certamente pedólogos, edafólogos, agrônomos e agricultores experientes saberão melhor formular do que eu.
Talvez possa se pensar que solos desprovidos de necromassa de superfície (solos provenientes de mineração, por exemplo) possam se beneficiar com a adição do “biochar”. Mas, em todos os casos, é melhor investigar com mais precisão sobre TODO esse procedimento, antes que queiram generalizá-lo e... (o que é muito pior!) antes de acharmos que esse produto é “um santo remédio” da geoengenharia e assim não precisaremos reduzir a emissão de gases do aquecimento global... e nem precisaremos nos preocuparmos em preservar nossas florestas!!!
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