A revista BIOTANEOTROPICA mantida pela FAPESP─Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, divulgou em seu número 10, vol. 4, 2010, doze artigos mostrando que as mudanças no Código Florestal Brasileiro não têm suporte científico.
Eis os resumos de cada um desses artigos, que podem ser lidos na íntegra no site http://www.biotaneotropica.org.br/v10n4/pt/. Estou divulgando-os neste blog em três etapas: nesta postagem estão os artigos de 1 a 4; na segunda postagem estarão os artigos de 5 a 8; e na terceira os artigos de 9 a 12. Os destaques em negrito são de minha autoria.
Todos os artigos desta revista vêm reforçar o que venho divulgando no presente blog sobre este tema. É só acessar as cinco postagens anteriores seguintes: 1) Ecologia em foco “de luto” (26/05/2011); 2) Mutilação do Código Florestal Brasileiro: uma avaliação importante de uma economista (09/05/2011); 3) Modificações propostas para o Código Florestal Brasileiro (14/12/2010); 4)...E ainda sobre as mudanças no Código Florestal (07/08/2010); 5) Modificações no Código Florestal Brasileiro: uma contribuição dos nossos legisladores ao Desenvolvimento “Insustentável” (10/07/2010).
Estes ensaios no presente blog foram precedidos por outros comprovando que nossas tragédias ambientais, como os deslizamentos em Santa Catarina e Rio de Janeiro, assim como as enchentes sucessivas em Pernambuco, Alagoas e Sergipe, e algumas outras ocorridas no sul do Brasil, apontam para a famosa “tragédia anunciada”; ou seja, é fácil prever que iriam acontecer, pelo manejo inadequado que damos às coberturas vegetais de encostas e margens de rios. Uma lástima, que parte da mídia brasileira tenta esconder do pouco esclarecido povo brasileiro, camuflando lobbies políticos e patrocinando reeleição de outros, interessados exclusivamente nos lucros do agronegócio (neste caso ver postagem de 08/12/2011 “Deputados que aprovaram novo código florestal receberam doação de empresas desmatadoras”).
1. A falsa dicotomia entre a preservação da vegetação natural e a produção agropecuária. (Luiz A Martinelli, Carlos A Joly, Carlos A Nobre, Gerd Sparovek)
Demonstramos que o Brasil já tem uma área desprovida de vegetação natural suficientemente grande para acomodar a expansão da produção agrícola. Demonstramos também que a maior expansão se dá nas áreas ocupadas pelas chamadas culturas de exportação: soja e cana-de-açúcar e não propriamente nas áreas ocupadas por arroz, feijão e mandioca, que são consumidos de forma direta pelo mercado nacional. Pelo contrário, a área colhida de arroz e feijão tem inclusive decrescido nas últimas décadas, enquanto a área colhida de mandioca encontra-se praticamente constante há quadro décadas. Os maiores entraves para a produção de alimentos no Brasil não se devem a restrições supostamente impostas pelo Código Florestal, mas, sim, à enorme desigualdade na distribuição de terras, à restrição de crédito agrícola ao agricultor que produz alimentos de consumo direto, à falta de assistência técnica que o ajude a aumentar a sua produtividade, à falta de investimentos em infraestrutura para armazenamento e escoamento da produção agrícola, a restrições de financiamento e priorização do desenvolvimento e tecnologia que permita um aumento expressivo na lotação de nossas pastagens.
2. Alterações no código florestal brasileiro: impactos potenciais sobre a ictiofauna (Lilian Casatti)
É apresentada uma análise dos possíveis impactos que a diminuição da vegetação nativa, notadamente das florestas ripárias, pode causar sobre a ictiofauna. Três conjuntos de aspectos funcionais primordiais desempenhados pelas florestas ripárias são discutidos: transferência de energia solar ao ambiente aquático, interceptação de nutrientes e sedimentos que adentram nos rios e trocas de material orgânico entre o sistema terrestre e aquático. Conclui-se que qualquer alteração que se traduza em mais perdas de vegetação nativa, seja em áreas de preservação permanente ou em reservas legais, pode gerar perdas de espécies, homogeneização faunística e diminuição de biomassa íctica.
3. A revisão do Código Florestal Brasileiro: impactos negativos para a conservação dos anfíbios (Luís Felipe Toledo, Sergio Potsch de Carvalho-e-Silva, Celso Sánchez, Marina Amado de Almeida, Célio F. B. Haddad)
Nos últimos meses está em efervescente discussão uma proposta para que um novo código florestal (Projeto de Lei n° 1876/99) substitua o vigente instaurado por meio da Lei Federal n° 4771/65 e modificado recentemente por Medidas Provisórias. Este novo código proposto, todavia, propõe alterações legais que devem afetar negativamente as populações naturais de anfíbios do Brasil. O declínio de anfíbios deve gerar impactos negativos tanto para a população (humana) nacional, como para a comunidade internacional. Entre os possíveis efeitos dessa lei, em consequência da perda de diversidade de anfíbios, podemos citar o aumento nos custos de produção agrícola, perda de matéria prima para produção de remédios, descontrole ecológico, eutrofização de corpos d'água, encarecimento do custo do tratamento de água para abastecimento humano, aumento de pragas agrícolas e aumento de doenças transmitidas por insetos vetores. Isto tudo é bastante preocupante ainda mais se levarmos em conta a própria perda da biodiversidade de anfíbios, o grupo de vertebrados terrestres mais ameaçado do planeta. Sendo assim, ressaltamos a necessidade de que, caso um novo código florestal seja elaborado, este tenha embasamento também em questões técnicas e científicas que impreterivelmente afetam, não só a conservação da natureza, mas também a economia, saúde e bem estar das populações humanas.
4. Impactos potenciais das mudanças propostas no Código Florestal Brasileiro sobre os répteis brasileiros (Otavio A. V. Marques, Cristiano Nogueira, Marcio Martins, Ricardo J. Sawaya)
Avaliamos os impactos potenciais sobre a fauna brasileira de répteis (721 espécies descritas até o momento), caso sejam adotadas mudanças propostas por um substitutivo do atual Código Florestal Brasileiro. A possibilidade de compensação ambiental (obrigação legal no caso de degradação de habitats naturais) em bacias ou microbacias distintas daquelas degradadas seria uma das modificações do código vigente que prejudicaria a manutenção da diversidade de répteis. Alguns gêneros de répteis são compostos por espécies que raramente co-ocorrem em uma mesma área. Assim, ações de conservação em escalas reduzidas, em unidades naturais como microbacias, seriam mais adequadas para representar a variação da composição de espécies entre áreas. O substitutivo prevê a exclusão de topos de montanhas como Área de Preservação Permanente (APP), bem como a redução da largura das matas marginais a cursos d'água (que também são APPs). Diversos répteis brasileiros estão restritos a áreas de altitude, ao passo que outros vivem somente ou principalmente em matas de galeria ou áreas ripárias. Assim, a perda de habitat nessas áreas deve tornar alguns répteis vulneráveis à extinção. A proposta também autoriza a recuperação de Reservas Legais (RL) usando espécies de plantas exóticas. Há evidências de que muitos répteis brasileiros não conseguem sobreviver em ambientes alterados pelo homem, incluindo as florestas constituídas por espécies exóticas. A proposta também tornará possível compensar RL dentro de unidades de conservação. Entretanto, as unidades de conservação existentes não seriam suficientes para a manutenção da diversidade de répteis no Brasil (principalmente porque muitas espécies têm distribuição restrita). Se adotadas, as mudanças propostas ao Código Florestal Brasileiro terão fortes impactos sobre a fauna de répteis brasileira, um importante componente do patrimônio natural do país. Além disso, moléculas com potencial farmacêutico, presentes nos venenos de muitas espécies, poderão ser perdidas.
[Continua...]
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