Subtítulo plausível para esta obra de leitura enriquecedora e agradável, de Eduardo Bueno (publicada em 2010 pela “Texto Editores Ltda., São Paulo, 480 p., ilustrações em cores”; e que comprei em 16/nov/2010 por R$62,91); valeu o investimento e o incentivo à produção cultural brasileira.
Ciclo da borracha. Reporto-me ao Capítulo 15, Brasil Amazônico, desse livro, sendo fiel ao propósito maior do meu blog, ecologiaemfoco.blogspot.com, onde postei: a Natureza e relações antrópicas; e desta feita um “misto quente: história com meio ambiente”. Faço comentários especificamente do tema “Ciclo da Borracha”, em que Eduardo Bueno começa citando Charles Marie de La Condamine, relatando a entrada oficial da borracha no mundo da ciência, em 1743, com as seguintes palavras (p. 176): “A resina chamada cautchu nas terras da província de Quito, vizinhas ao mar, é também muito comum nas margens do Marañon e se presta para os mesmos usos. Quando fresca, pode ser moldada na forma desejada. É impermeável à chuva, mas o que a torna mais notável é sua grande elasticidade. Fazem-se garrafas que não são frágeis, botas, bolas ocas, que se achatam quando apertadas, mas retornam à forma original quando cessa a pressão”. Eduardo Bueno complementa, entre várias outras informações sobre a borracha: “Em poucos anos se tornaria o produto vegetal mais importante e mais cobiçado do planeta, provocando o “boom” econômico que faria Manaus se transformar, quase que da noite para o dia, de aldeia indígena, em capital industrial e recolocando (depois do açúcar e antes do café) o Brasil no mapa econômico mundial”. Esse produto fabuloso, o cao o’chu (árvore que chora), depois batizado de látex, provocou muitas modificações nos usos e costumes da humanidade, tendo participado decisivamente do progresso mundial (depois da invenção dos motores à explosão), pois os pneus dos veículos automotores eram fabricados com o látex da seringueira (Hevea brasiliensis). Participaram dessa arrancada (BUENO, 2010; p. 177) nomes hoje conhecidos como “marcas comerciais”, como os de Charles Goodyear (em 1839 criou a vulcanização, adicionando enxofre à borracha quente), John Dunlop (em 1888, com o pneu de bicicleta), Karl Benz (que em torno de 1885 criara o automóvel movido a gasolina e que ganharia em seguida, pneus de borracha) ...
O apogeu da borracha brasileira. O apogeu da borracha ocorreu entre 1879 e 1912. Em 1880 (continua BUENO, 2010, em sua narrativa), Manaus, com 50 mil habitantes, exportou 12 mil toneladas de borracha para a Europa. A seca no nordeste, de 1877-79 provocara a migração, principalmente de cearenses, para a Amazônia, fazendo com que esses novos seringueiros extraíssem látex de 8 milhões de árvores espalhadas por 3 milhões de quilômetros quadrados (imensa área, considerando-se que naquela época a seringueira existia com certa exclusividade na bacia hidrográfica do rio Amazonas). Mesmo com a taxa de mortalidade “nas alturas”, devido à malária e febre amarela, mas cada seringueiro ganhando da Ford U$5 por hora de trabalho, os seringueiros levaram suas esposas, filhos, tios, tias, sobrinhos... amontoando-se em barracos de caixa de madeira e lona e mesmo sob calor e chuva “iam levando”... até que começa a ocorrer...
A derrocada. Destaco inicialmente o que afirma BUENO (2010; p. 177): “Embora a produção de borracha brasileira viesse a ganhar sobrevida com a eclosão da II Guerra Mundial, a exploração incompetente, cruel e irracional deste extraordinário recurso vegetal acabaria transformando aquele ciclo econômico numa espécie de ópera-bufa”. Esta não me parece ser uma explicação plausível. Vejamos a seguir. E agora duas “estórias” sobre o declínio dos nossos seringais. Primeiramente uma possível “estória pra boi dormir”: ... que os exageros dos barões da borracha, de Manaus, conduziram à falência desse item ímpar, de exportação; depois outra, pior ainda: que os seringueiros “torravam seus ganhos na bebida” e se descuidaram da produção. E agora, não uma “estória”, mas uma história verossímil: o fungo Microcyclus ulei, causador do mal-das-folhas da seringueira (Hevea brasiliensis), é o maior responsável pelo insucesso da heveicultura nas áreas tradicionais de cultivo no Brasil. Isso já me explicava, no início da década dos de 1970, Dr. Paulo Alvim (fitofisiólogo principal da OEA e diretor científico do CEPEC – Centro de Pesquisas do Cacau, Ilhéus-Itabuna, BA): um minúsculo fungo destruiu um projeto econômico de grandes proporções e até um sonho norteamericano, a Fordlândia, uma cidade construída com milhões de dólares em plena selva amazônica, visando explorar borracha para a fabricação de pneus para os carros fabricados pelo maior magnata do mundo, Henry Ford; e que entre 1927 e 1945 tal cidade viveu momentos de glória no estilo norteamericano. Daí veio o fungo, que encontrou condições ideais à sua proliferação, ou seja, cultivos homogêneos da seringueira sem possíveis “inimigos naturais”, num ecossistema onde o equilíbrio natural dinâmico (ou homeostase) foi rompido “sem nenhuma precaução”, transformando tal sonho em pesadelo irreversível. Em 1876 o inglês Henry Wickhamlevara milhares de mudas da seringueira para a Inglaterra, com a intenção de plantá-las depois na Malásia, que após mais ou menos 30 anos se tornou o maior produtor mundial do látex (hoje, Indonésia e Tailândia são dois outros grandes produtores). Já em 1913 as seringueiras malaias produziram 47 mil toneladas de látex, contra 37 mil toneladas no Brasil.
Lição a se aprender. Espero que tudo isso nos sirva de lição para todas as gerações subsequentes. Muito cuidado com os cultivos homogêneos! Aprender com a Natureza é privilégio dos racionais! Ao Eduardo Bueno (que duvido que leia este “bloguinho”) uma sugestão para inserir a presente historieta (recontada aqui por mim) da derrocada da seringueira ao “Ciclo da Borracha”.
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