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1 de jun. de 2013

SECA NO NORDESTE: O SÃO FRANCISCO NÃO É O SANTO MILAGROSO

POLÍTICA AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
No Brasil estamos instituindo a prática do mau hábito, ou tragédia, de se tomar decisões puramente políticas, negligenciando e até ignorando completamente o que é descoberto e revelado pela ciência. Fizemos isso com o Código Florestal Brasileiro e agora estamos fazendo com a Transposição ou Integração do rio São Francisco, como se esta fosse uma solução para dizimar fome e sede no Nordeste. Uma atitude típica de país de terceiro mundo. Isso, não é desenvolvimento sustentável.

Comprove-se, por esta entrevista com JOÃO SUASSUNA.

[Entrevista com João Suassuna, reproduzida do portal de ECODESENVOLVIMENTO http://www.ecodesenvolvimento.org/avina-leadership/o-nordeste-tem-muita-agua-afirma-joao-suassuna?tag=biodiversidade
e algumas informações adicionais da ASA Brasil - Articulação do Semiárido Brasileiro http://www.asabrasil.org.br/
incluindo o vídeo da rede Globo (http://glo.bo/12pIkxl), obtido através da ASA Brasil]

 João Suassuna, pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco (Recife, PE) é engenheiro agrônomo,  sendo um dos especialistas mais respeitados do Brasil quando o assunto é a hidrologia do semiárido, principalmente em relação ao Nordeste seco do país.

Pergunta: O senhor critica bastante o projeto de transposição do rio São Francisco [ou Integração do S. Francisco, como alguns preferem agora chamá-lo]. Qual a razão?
João Suassuna: O Nordeste tem muita água. Para você ter ideia, o Nordeste acumulou, em suas represas, algo em torno de 37 bilhões de metros cúbicos d’água – é o maior volume de água represada em regiões semi-áridas do mundo. O que nós não temos ao certo, é uma política específica que faça com que esta água que já existe seja distribuída para as torneiras das populações. E é nesse cenário que o governo federal quer trazer a água do São Francisco para abastecer as principais represas do Nordeste e fazer com que haja o que eles chamam de “sinergia hídrica”.

Pergunta: Qual o significado da expressão "sinergia hídrica”?
João Suassuna: O impedimento de que as represas sequem. Mas o que precisa estar claro é que o Nordeste tem grandes represas que jamais secarão, mesmo com o uso contínuo dessa água. Então se a água do São Francisco abastecer as principais represas da região, ela acabará sendo usada de maneira errada.

Pergunta: E por que?
João Suassuna: Porque essa água não vai resolver os problemas de quem mais precisa: a população difusa do Nordeste. E olhe que estou falando de algo em torno de 10 milhões de pessoas, que no exacerbar de uma seca passam sede e fome.

Pergunta: Qual alternativa o senhor propõe?
João Suassuna: Para problemas difusos, você precisa de soluções também difusas. Ao cair nas grandes represas, a água do São Francisco vai favorecer ao grande capital. Lá em Fortaleza, o governo do Ceará está construindo uma siderúrgica que sozinha vai consumir um volume de água capaz de suprir a necessidade de um município de 90 mil habitantes. Então se a água do São Francisco cai na Barragem do Castanhão, que é a maior represa do Nordeste, e que já há um canal que a liga até o Porto de Pecém [OBS.: CSP-Companhia Siderúrgica do Pecém, da Vale do Rio Doce em parceria com siderúrgica sul-coreana, no mun. de São Gonçalo do Amarante, próximo a Fortaleza], lógico que esta água irá abastecer esta siderúrgica. É aí que entra o que nós consideramos como a “indústria da seca”. Estão prometendo abastecer 12 milhões de pessoas no Nordeste com a água do São Francisco, e não vai acontecer isso. Essa água será utilizada para o agronegócio, e é aí que temos investido o nosso trabalho. Nós temos 74 artigos publicados na internet denunciando essa realidade.

Pergunta: A construção de cisternas é uma boa alternativa?
João Suassuna: Sem dúvida. Não é um canal de transposição que vai resolver os problemas socioeconômicos dos que mais precisam, no caso, a população difusa. Ora, se hoje, nas margens do São Francisco você já tem problemas de desabastecimento, não é um canal que vai receber tal impasse, porque nesse projeto não há a previsão de uma distribuição razoável dessa água para resolver o problema. Simplesmente não há.
Por intermédio da Agência Nacional das Águas (ANA), o governo federal editou o Atlas Nordeste de Abastecimento Humano de Água, que busca o abastecimento para 34 milhões de pessoas. Esta sim é uma grande ideia que está sendo implantada. Abrange um número muito maior de municípios e, pasme: custa a metade do que está previsto na transposição do Rio São Francisco. Esse projeto atende o problema de desabastecimento para os municípios até 5 mil habitantes. De que forma? Com a água que já existe na região, através da adução das águas já existentes nas represas, nos poços, enfim.

P1MC - Projeto 1 milhão de cisternas. ASA Brasil

Pergunta: E o que é adução?
João Suassuna: Tubulações para recalcar a água. [OBS.: A grosso modo, recalque, também chamado de adução, significa o simples transporte de água de um determinado ponto a outro (geralmente para um local mais elevado) utilizando-se, para tanto, um sistema de bombeamento d’água, também chamado de sistema adutor] Para a área rural, referente às comunidades difusas, que moram nos pequenos lugarejos, grotões, pés de serra, existem alternativas, como as que vêm sendo trabalhadas pela ASA Brasil – que desenvolve um programa de 1 milhão de cisternas na região seca do Nordeste. [OBS.: ASA Brasil: A Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) é uma rede formada por mil organizações da sociedade civil que atuam na gestão e no desenvolvimento de políticas de convivência com a região semiárida Endereço eletrônico: http://www.asabrasil.org.br]  Esse programa já tem cerca de 300 mil cisternas implantadas. Uma cisterna de 16 mil litros resolve o problema de uma família de 5 pessoas durante os oito meses sem chuva na região.  [OBS.: assista ao vídeo http://glo.bo/12pIkxl] O Nordeste seco concentra suas chuvas quatro meses e nos oito meses restantes não chove, então, a cisterna rural abastece essas pessoas com água para beber e cozinhar durante oito meses. Nós temos que incentivar esse tipo de iniciativa, e não um projeto que vai trazer a água do São Francisco, que fica a 500 km do local de consumo, com preços exorbitantes.


   Conclusão. Como se vê, ciência por aqui não prevalece. Talvez um político não tivesse a coragem de desobedecer a uma orientação de um médico que lhe prescrevesse um medicamento ou tratamento para resolver um problema da saúde dele. Mas em termos de meio ambiente, a história muda.
 Não é difícil observar que neste caso prevalecerá o agronegócio. O problema em si, da fome e da seca, fica para ser resolvido "depois, quem sabe, de uma próxima eleição"!!!

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