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16 de out. de 2015

NO BRASIL É ASSIM: PRIMEIRO, ENERGIA. DEPOIS, ÁGUA. EXEMPLO DO PANTANAL

...  “O setor elétrico manda na gestão de recursos hídricos no Brasil” (Débora Calheiros)


Alguns destaques desta entrevista, que pode ser lida por completo no link acima:

“(…) a lei determina que os usos múltiplos devem ser respeitados. Mas do jeito que está, praticamente apenas um único usuário, o setor elétrico, está utilizando os recursos naturais dos quais dependem milhares de pessoas”.


((o))eco: Qual é a atual situação dos empreendimentos hidrelétricos na Bacia do Alto Paraguai?

Quando comecei a trabalhar com essa questão, em 2008, havia uma previsão de 116 empreendimentos geradores de energia hidrelétrica a serem instalados, e cerca de 22 em funcionamento. Agora são 162 previstos e 44 instalados na Bacia do Alto Paraguai, sendo 8 de grande/médio porte (UHEs) e 36 Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), que já representam 70% do potencial total da bacia. Mas o setor elétrico ainda quer mais, quer os 100%, com mais 118 barragens, sendo 3 UHEs e 115 PCHs.

O setor elétrico não tem limites, especialmente em relação às chamadas Pequenas Centrais Hidrelétricas no Brasil. É um dos investimentos que mais geram lucros. As PCHs têm um processo de licenciamento mais fácil, mais simplificado, com atrativos financeiros muito fortes. É por isso que estão pipocando por aí, sem qualquer controle ou planejamento do impacto conjunto e sinérgico de todos os barramentos em nível de bacia, como determina a legislação.

[Agora, senhores leitores, vejam a árdua tarefa que esta conceituada bióloga decidiu enfrentar neste país]:

"Passei a atuar junto com a sociedade civil em relação ao projeto de hidrovia Paraguai-Paraná no início dos anos 1990 e, daí em diante, nunca mais vi a ciência como uma atividade separada da sociedade. Desde então, atuo diretamente no que hoje se discute como “papel social da ciência”, tentando encurtar o caminho entre a ciência e os tomadores de decisão".

[Parabéns, doutora. Desejo-te bons resultados...e boa sorte! Com certeza vai precisar, porque por aqui, "decisão política negligencia informações científicas e até, atropela o bom senso"!!!]

((o))eco: E quais são os argumentos impeditivos a esses empreendimentos?

Os impactos da construção de barragens na conservação de ambientes aquáticos e de seus serviços ambientais é uma preocupação mundial. Com base nos Princípios da Precaução e da Prevenção [Rio 92 - Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento], isso deveria ser discutido tecnicamente, de forma multidisciplinar, e deveriam ser realizados estudos para propor alternativas e ações mitigatórias.

Todas as alterações e impactos no funcionamento hidro-ecológico de cada sub-bacia formadora do Pantanal deveriam ser avaliados de forma conjunta e integrada, levando-se em conta a área da Bacia Hidrográfica do Alto Paraguai e o Princípio de Usos Múltiplos, como determina a Lei de Recursos Hídricos [Lei 9.433/1997], bem como a Resolução CONAMA 01/1986 [que se refere à avaliação de impacto ambiental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente], antes de se implementar tais projetos.

A multiplicidade de usuários na região inclui ribeirinhos, pescadores profissionais e amadores, turistas, produtores rurais de pequeno a grande porte, os setores de turismo e navegação, além do setor elétrico.

A produção pesqueira é a alma do Pantanal, culturalmente, socialmente e economicamente. E a lei determina que os usos múltiplos devem ser respeitados. Mas do jeito que está, praticamente apenas um único usuário, o setor elétrico, está utilizando os recursos naturais dos quais dependem milhares de pessoas. Na verdade, eles estão se apropriando dos recursos hídricos.

((o))eco: Mas o setor elétrico, e até mesmo representantes dos órgãos licenciadores, alegam que as PCHs são a fio d’água e que isso não prejudicaria os pulsos de inundação.

Todas as PCHs são a fio d’água. É o sistema de tomada de água, o desenho de engenharia da barragem, sem necessariamente formar reservatório. O problema é fazerem várias barragens num mesmo rio. Por exemplo, no rio Coxim, estão previstas dezoito. Aí cada uma vai alterando um pouco o fluxo das águas e no final temos uma alteração expressiva. Há necessidade de barramentos, muitas vezes de altura elevada, de 10m a 40m, resultando também em alteração da descarga de nutrientes e material em suspensão e, portanto, da ciclagem de nutrientes, importantes na manutenção da cadeia alimentar aquática e na interação terra-água, que resulta em fertilização do solo, útil para o desenvolvimento de pastagens nativas, por exemplo.

As PCHs são construídas em áreas de cabeceiras, que são as áreas mais sensíveis para o período reprodutivo dos peixes. Isso retém os sedimentos, os nutrientes, muda a temperatura da água do fundo e da superfície, e são barreiras físicas intransponíveis, interferindo na reprodução dos peixes.

[Entrevista completa no link mostrado no topo...]

[Por isso, acrescento: "No Nordeste, muitas pessoas ainda acreditam que a transposição do rio S. Francisco vai salvar a região da seca"]

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