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2 de mar. de 2009

REPRESAS E TERREMOTOS: NÃO PODEMOS ESQUECER OS 70 MIL CHINESES MORTOS
























[Baseado em artigo publicado em Newscientist, 31 de janeiro/2009 e assinado por A. C. Grayling, filósofo de Birkbeck, University of London]

Em 12 de maio de 2008 ocorreu um terremoto de 7,9 na escala Richter na província de Sichuan, na China. Cerca de 70 mil pessoas morreram; 5 milhões de desabrigados, rios bloqueados e o risco de que 300 represas se rompessem, foram contabilizados nesse evento de grandes proporções e maiores preocupações. Se alguma grande represa tivesse se rompido o desastre teria uma dimensão catastrófica difícil de ser imaginada.
O terremoto foi sentido em locais distantes, como Índia, Taiwan e Mongólia. A causa residiu na falha existente entre o alto platô do Tibete e a crosta por baixo da bacia de Sichuan e o sudeste da China. A sismologia nos ensina que terremoto ocorre quando estresse tectônico acumulado ao longo de falhas atinge um ponto crítico e de repente há uma liberação de tensão, ocorrendo então o terremoto. Há sempre especulações a respeito do que precipita o processo em si. É óbvio que uma causa natural sempre seja apontada como responsável; mas... e se a verdadeira causa for ação ou ações antrópicas?!
Seismólogos têm sugerido recentemente que uma nova represa de Sichuan, a Zipingku, localizada no rio Min perto de Dujiangyan e concluída em 2006, possa ter sido responsável por ação desse tipo. A imensa carga de água retida no reservatório da represa pode ter sido o estopim da liberação catastrófica do estresse existente sobre a “falha de Longmenshan”. Os seismólogos sustentam que advertiram sobre os riscos de terremotos nesse local.
Sichuan é uma região com muitas represas, tendo a maioria sido construída nas décadas recentes. A maior delas já é mundialmente conhecida: a represa das Três Gargantas, no rio Yangtze. É a maior represa do mundo, distando 550 km a leste do epicentro do terremoto de Sichuan. A ocorrência desse terremoto apressou os engenheiros a verificarem a segurança das Três Gargantas. O inverso, ou seja, checar as possibilidades de terremotos ou outras implicações ambientais na região, antes que ocorram, já não é objeto de urgência por parte de engenheiros envolvidos num alucinante processo de busca por crescimento econômico; como aliás deveriam ter feito para a represa de Zipingku antes de ser construída.
Algumas características da represa das Três Gargantas. A parede de concreto tem cerca de 2309 m de comprimento, 101 m de altura, medindo 115 m de espessura na base e 40 m no topo. Foram utilizados 27.200.000 m3 de concreto, 463.000 toneladas de aço (suficientes para construir 63 torres Eiffel); e foram mobilizados 102.600.000 m3 de terra durante a construção. Quando o nível de água atingir o máximo, estará a 91 m acima do nível do rio, tendo o represamento um comprimento total de 660 km e uma largura média de 1,12 km contendo um volume total de água de 39,3 km3. O reservatório cobrirá uma área total de 1045 km2. Quando essa área é comparada à do reservatório de Itaipu (1350 km2) percebe-se que há maior concentração de volume de água nas Três Gargantas.
Numa das fotos acima vê-se a câmara elevatória de navios, capaz de elevar 12.800 toneladas a uma altura de 113 m.
O terremoto de Sichuan teve conotações especialmente trágicas pelo fato de que muitas mortes ocorreram entre crianças nas escolas, onde os tetos desabaram sobre elas. Esta é uma combinação “perversa”: a correria para construir represas e escolas de estruturas precárias; ou seja, resultado de falta de cuidado, valores distorcidos e insensatez.
Surge assim com esse exemplo do mundo oriental em transformação, um questionamento muito sério a respeito de ciência e tecnologia. Além disso, essa gigantesca represa constitui-se num “grande reservatório de controvérsias” (política, econômica, ambiental, social; assunto extenso demais, que demandaria um próximo capítulo).

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